Se é verdade que as grandes batalhas são dadas aos grandes guerreiros, o Boavista tem tido tudo menos motivos para colocar a espada em repouso. No Bessa vivem-se momentos conturbados e o sol teima em não espreitar por detrás das nuvens cada vez mais carregadas.
Aos inúmeros problemas com os quais os panteras já se deparam, mais dois adicionais: João Gonçalves e Luís Pires contraíram lesões graves e vão ficar muito tempo afastados. A solução? Tomé Sousa, um jovem de 17 anos e candidato ao onze inicial boavisteiro na próxima segunda-feira, na Amadora.
É na necessidade, nos momentos de crise, que por vezes se dá o pontapé de saída para as melhores histórias, as maiores carreiras. Ainda se lembra de como tudo começou para Rui Patrício? Foi atirado aos leões com apenas 18 anos, em novembro de 2006, por indisponibilidade de Ricardo e Tiago, e o resto é história. Quem sabe se não estaremos perante o nascimento de uma nova estrela, agora no covil da pantera.
«Vai estar à altura do desafio»
«Trabalhei com o Tomé no Boavista, em sub-11, sub-12 e sub-13. Já na altura, era um atleta muito focado na parte técnica e tática. Tinha um grande conhecimento do jogo, era muito inteligente, mas a parte que mais sobressaía é que era muito forte mentalmente. Nos momentos de decisão era muito forte», contou ao zerozero o responsável por orientar o guardião nos primeiros anos da formação, Saga.
Conhecedor profundo das capacidades do menino que se prepara para, muito provavelmente, ter a oportunidade de ouro nas mãos, o técnico ajudou a traçar o perfil: «Além de ser um guarda-redes que joga muito bem com os pés, é quase um jogador de campo. Aliás, em muitos dos treinos chegou a jogar como jogador de campo e fê-lo muito bem. Sempre se viu uma margem de progressão muito grande nele. Era um guarda-redes com bastante segurança entre os postes e nas saídas da baliza.»
Fazer o primeiro jogo da carreira enquanto sénior já é complicado. Fazê-lo na I Liga, aos 17 anos, aumenta ainda mais a dificuldade. O contexto atual do Boavista, onde a estabilidade é pouca ou nenhuma, coloca a missão quase ao nível de jogar FIFA em dificuldade Lendário.
«O primeiro jogo como profissional é difícil para qualquer um. Estaria a mentir se dissesse que o Tomé não vai sentir pressão ou ansiedade. É perfeitamente natural que sinta», afirmou Saga.
As palavras que saem da boca do técnico trazem consigo tranquilidade e transmitem uma confiança que rapidamente é verbalizada. «Vai estar à altura do desafio. Vejo muito potencial e acredito que vai dar uma alegria. Acho mesmo que tem um futuro muito promissor pela frente», disse.
«Os grandes feitos surgem sempre com oportunidades inesperadas»
Apesar dos tenros 17 anos, Tomé Sousa já é internacional sub-18 e já esteve convocado para a seleção nacional de sub-20. O guarda-redes está já algumas etapas acima no processo, o que Saga considera que nem sempre é o ideal, mas perante tamanho talento não há nada a fazer.
«Acho que tem condições para o fazer [agarrar o lugar]. Nós, treinadores, não gostamos muito de queimar etapas, mas quando a qualidade e o potencial existem, até faz sentido queimar etapas. No caso do Tomé, acredito que, apesar de ser um momento em que a oportunidade surge por necessidade, é mais do que merecida. É uma posição difícil, porque, ao mínimo erro, está mais exposto do que um jogador de campo, mas acredito que possa agarrar o lugar e surpreender muita gente», atirou.
Saga reforçou a importância de que «seria melhor para ele não assumir agora, é precoce», mas vou a mostrar-se confiante nas capacidades do jovem guardião: «Seria melhor [não assumir], mas o momento é agora e com o valor que ele tem, não vai desiludir. Os grandes feitos surgem sempre com oportunidades inesperadas e esta é uma dessas.»
As qualidades que Saga identifica em Tomé Sousa dentro do relvado também se transportam para fora das quatro linhas. Aí, encontramos «um rapaz com uma educação exemplar, extremamente brincalhão e super bem disposto», de acordo com o técnico.
Contudo, a brincadeira tem hora limite e Tomé não tem dificuldade em mudar o chip quando o momento é de trabalhar: «Tem noção de quando é para trabalhar, tem um foco incrível e é muito dedicado. É muito sedento de aprender e isso é muito importante. Sabe ouvir e esperar pela oportunidade», concluiu.
Esta segunda-feira pode ser histórica para Tomé Sousa. O guarda-redes de 17 anos perfila-se para eventualmente assumir a baliza boavisteira e tornar-se no quinto guarda-redes mais novo a jogar na I Liga.